Aos humanos
(menção honrosa na categoria Cartas - 1ª edição do Concurso Literário Guemanisse de Crônicas, Cartas e Trovas/RJ 2010)
Prezados co-habitantes
Fui encarregada por meus semelhantes e afins para escrever esta carta. Tarefa difícil, acreditem, pois embora conheça a questão de todos os envolvidos e seja igualmente afetada pelos mesmos problemas, tive que deixar de lado minhas próprias emoções para tentar, da forma mais isenta possível, expor os fatos.
Somos todos habitantes do mesmo planeta e tudo indica que fomos aqui colocados com os mesmos propósitos, cada um com sua função definida, mas interdependentes, como engrenagens de uma grande e formidável máquina.
Para alguns, foi concedido o dom da expressão, falada ou escrita, através do que, ao longo dos tempos, se tornaram os dominantes. Uns mais outros menos, em muitos momentos, dominando-se mutuamente.
Para outros, no entanto, aparentemente inexpressivos, restou a dominação. Eu faço parte deste grupo.
Personagens passivos de uma história que se desenrola há milênios, temos carregado o pesado fardo da nossa situação de pacientes. Muitos de nós frágeis, impotentes, senhores apenas em seu habitat, manietados pelo progresso, cedemos palmo a palmo nosso território nem sempre voluntariamente.
Eis que, o que víamos através da mídia, hoje, bate à nossa porta. Nosso espaço decantado como paradisíaco, vem rapidamente tornando-se inóspito, e parafraseando o poeta, em breve “já não poderemos fazer mais nada”.
Esperamos por muito tempo os que vestiam nossas cores fazer por nós. Eles tentam, é verdade, mas são em pequeno número e parecem a cada dia engrossar conosco a falange de dominados.
Assim, decidimos nos unir. Somos um bando de desesperados que, sem ter o que perder, parte para sua autodefesa, e talvez, das gerações futuras. Por incrível que pareça, o êxito de nossa luta, trará o bem para aqueles que atentam contra nós. Mesmo assim, estamos decididos a não abrir mão.
Não sofreremos mais solitários. Não mais permitiremos que nossos membros amputados caiam onde determinarem. Num derradeiro esforço, lançaremos partes de nós sobre nossos algozes, e num último ato, a nós mesmos sobre suas moradas, seus bens, seus entes queridos. Parece justo, afinal, se aqui realmente fomos colocados com o mesmo propósito, será uma vida por outra.
É uma luta desigual, bem sabemos, pois estamos desarmados. Mas, se preciso for, tiraremos da própria terra a munição, do ar o alimento e do sol, a energia que nos moverá.
Esta carta, mais que um desabafo, é um aviso. Uma ameaça, por que não?
Nossa luta é digna e válida, pois no fim de tudo, lutamos pela sobrevivência da raça humana que, sem nós, a cada ano abrevia seus próprios dias.
Atenciosamente,
Árvore
MARIA LUIZA FALCÃORepresentante da APPERJ em Belo Horizonte